sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

ERA UMA VEZ UM POVO


Victor Silva Barros

ERA UMA VEZ UM POVO

Era uma vez um povo
cantando toda a desgraça,
aceitando mesmo a fome
a que o obrigaram uns,
enchendo cada vez mais a pança!
Era uma vez um povo
chorão,
sentimentalão,
vibrando com a bandeira
ondulante,
hasteada,
em cada vitória atlética,
gritando a cada golo de Ronaldo
acompanhando da Marisa o fado!
Era uma vez um povo
arrastando-se na desgraça,
esquecendo a grandeza
que a pátria
já construi um dia!
Levanta-te povo que é hora
de correr com  a gentalha,
de tomares nas tuas mãos,
o teu,
os nossos destinos!
Afasta os estranhos Restelos
que vivem do teu suor
e encontraremos no dia a dia
um 25 de Abril melhor!

FELICIDADE


Artur Bual

FELICIDADE

Hoje fui feliz,
nada aconteceu
de especial,
mas, havia uma leveza
no ar,
o coração serenado!
Ter-te a meu lado
a tomar, simplesmente
um café,
fui canto e dança,
contradança, despique,
respirar, descansar,
tocar, beijar,
rebolar na areia,
ler a Odisseia,
estar na Grécia ,
percorrer ilhas pequenos
passear à noite em Atenas,
festejar com os deuses
na Acrópole
a vida, a terra,
a imensidão do mar!

ANIVERSÁRIO

Júlio Pomar

ANIVERSÁRIO

Mais uma vez perdemos
o aniversário
anunciado por email
do nosso amigo Tiago!
Ninguém nos viu
nessa jantarada
de churrasco,
regada a sangria tinta,
abrilhantada com um grande bolo
de chocolate amargo!
Imaginei da nossa janela
a música tocada:
pop anos oitenta
e muitos corpos vibrando!
Recordo entristecida
a lonjura
que nos afasta,
lembro-te menino,
carregando a pesada mochila
a caminho da escola primária!
Caíu o livro da leitura,
corri e apanhei-o,
levando-o na mão
até à tua carteira!
Desde aí ficámos amigos
olhando a vida
com os mesmos sonhos,
deixadas cair as mágoas,
debruçados no crepúsculo,
descuidado e quente
dos Verões que passámos juntos!

UMA TARDE NO CAMPO


COLLADO

UMA TARDE NO CAMPO

Levei-te a merenda
num cesto de verga,
a meio da tarde
suada,
num dia de calmaria surda!
As vinhas maduras
bordejavam a quinta
e os bagos soltavam-se
sem pressa!
O restolho do trigo
quedava-se caído
depois da farta colheita!
A água da levada
dessedentava as hortas!
Arregaçado,
no meio do campo
abrasado,
recebeste-me à sombra
de uma figueira!
Comemos os dois
fatias finas de broa de milho,
petingas fritas em azeite,
bebendo
vinho verde tinto!
Momentos de descanso,
sem inimigos
por perto,
tendo o fruto das sementes
brotado por todo o lado!

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

POESIA


José Gonzalez Collado
POESIA

A poesia
buscou-me a mim
ou procurei-a eu?
Não sei de onde veio
esta vontade meticulosa
de agarrar na caneta,
escrever frases curtas
com alguma sonoridade!
Eram vozes estranhas
acordando-me,
pedindo-me,
cria poesia!
Sempre que um farol
esquecido
brilhava na neblina,
alumiando a praia,
eu escrevia!
Sempre que alguém
solitário,
contava as estrelas
de um céu confuso,
eu escrevia!
Sempre que um amor
se perdia
num erro de partilha,
eu escrevia!
Sempre que a alma
sangrava,
não podendo
ter asas,
eu escrevia!
Escrevi o primeiro poema,
o segundo,
depois era a caneta
que já escrevia sozinha!
Desenhava fogo, lama,
o som do vento agreste,
crepitação da madeira
aquecendo
uma sala fria!

NAVIDAD

José González Collado

NAVIDAD

Nasci,
num dia de Maio frio,
sem ter sido programada!
Todos olhavam
pasmados:
as avós, as tias avós,
as tias simplesmente,
aparando
o rebento,
após infindas horas de parto!
Era rechonchuda,
de olhos claros
e careca!
Deixei a mãe exaurida,
rasgada,
retiraram-me a ferros,
difícil foi nascer!
Descansou finalmente
a parteira,
a avó Maria,
depois da louca correria
entre o quarto e a cozinha,
aquecendo água,
toalhas
e outras tralhas
que me trouxeram à vida!
O partro foi obscuro
com muita oração
à mistura,
em coro,
como as carpideiras,
pedindo a Deus
hora pequenina!
Entrei no mundo
com o florir das cerejeiras,
ventos moderados
e muitos espaços largos
para eu os preencher!

TERTÚLIA


TERTÚLIA

Todos os terceiros sábados
de cada mês
estamos aqui sentados,
perfilhados em mesas redondas,
trincando bolinhos caseiros
e bebericando vinho do Porto
rubi!
Estamos felizes
a partilhar a nossa poesia,
umas mais agressiva,
panfletária,
outra mais redonda,
mais bucólica!
Mas toda, toda,
tendo a alma despida,
pondo à prova
sentimentos, dores,
sonhos, ânsias,
decepções, ilusões,
e força!
Vale a pena lutar
com as armas que temos!
Vale a pena abraçar
causas em que acreditámos!
Tertúlia despretensiosa,
aproximando pessoas,
traduzindo mistérios,
sossegando vidas!
Todos diferentes
e todos iguais
construíndo com as palavras
edifícios para ficar!
Permanecemos juntos
desde há cinco anos,
lendo,
declamando,
sorrindo,
partilhando,
o que é tão nosso
a POESIA!

UMA TARDE NO CAMPO

José Gonzales Collado

UMA TARDE NO CAMPO

Levei-te a merenda
num cesto de verga,
a meio da tarde
suada,
num dia de calmaria surda!
As vinhas maduras
bordejavam a quinta
e os bagos soltavam-se
sem pressa!
O restolho do trigo
quedava-se caído
depois da farta colheita!
A água da levada
dessedentava as hortas!
Arregaçado
no meio do campo
abrasado
recebeste-me à sombra
de uma figueira!
Comemos os dois
fatias finas de broa de milho,
petingas fritas em azeite
bebendo
vinho verde tinto!
Momentos de descanso
sem inimigos
por perto,
tendo o fruto das sementes
brotado por todo o lado!

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

TELA

Victor Silva Barros

TELA

No principio era o nada,
a brancura infinita
do vazio,
pronto ou não
a ser preenchido!
As ideias fervilham
na cabeça
do pintor ousado!
Sem palavras,
com tintas e pincéis
salta para a tela
a vida,
a cidade,
o barco que navega
sem perturbar o rio,
as  pessoas,
as memórias!
A pintura ganha sentido,
emociona,
brinca com o pintor
e com quem a olha!

DIA NA ALDEIA

José Gonzalez Collado
DIA NA ALDEIA

Ali sentados,
no muro divisório
da courela,      
o sol abrasador
amadurava
os cachos que pendiam
da ramada!
O silêncio
dos trigais dourados
era quebrado
pelo arrulhar das pombas
e tudo era tão perfeito,
tão equilibrado!
O que é nosso
ali nos foi ter,
a água fria da fonte,
o pão negro de centeio
regado a mel de urze!
A lua
para onde  nos transportámos
à noite,
as colinas
onde desenhámos barcos
para navegar!

COR DE AMORA

José González Collado
COR DE AMORA

O que eu sofri
por aquele vestido
cor de amora!
Vi o tecido
na montra
 da única loja da aldeia,
cobicei-o,
namorei-o,
roguei à minha mãe
que mo oferecesse!
Chorei
perante a iminência
de o não ter!
Em redor de mim
a explosão
da negação,
acendia!
Mãe eu queria tanto
um vestido cor de amora,
uns sapatos malva a condizer!
No baile anual
da colectividade musical,
serei um arraso
voltando
o vestido cor de amora!
Perante um não rotundo
da mãe enervada,
a avó tirou o varaço
do  seu saco gasto!
Um punhado de moedas
saltou
para a minha mão,
comprou um sonho
maior que o Natal!