segunda-feira, 1 de novembro de 2010

MOMENTO

JOSEFA GALHANO
in:http://salaodaprimaverade2011.blogspot.com/


 
Neste silêncio de gaivotas feridas,
penso o teu rosto vestido de amoras,
em Verões escaldantes
da nossa infância acostada
a cais de navios ausentes!
Eram longos os estios,
os pés enterravam – se nas veigas,
brotando uma frescura que acalmava
corpos e ancestrais nogueiras!
À tardinha esgotados,
baloiçávamos na vontade de partir!
O ruído das cigarras cantadeiras
ensurdecia os ouvidos,
os campos em delírio,
ofereciam trigo maduro
molhado em compota de maçã!
Tudo ficava retido
em momentos únicos
de serões prolongados
que eram contados e recontados
por todos nós!
Á noite as camas de ferro,
cobertas com liteiros de trapo,
apagavam os cansaços,
tudo ficava calado,
e por fim calmamente, adormecia!

terça-feira, 29 de junho de 2010

BARCO NEGREIRO

Albano Neves e Sousa
in:http://vieiraportuense.blogspot.com/

Porque existo
numa terra cobiçada,
África ardente,
ofertando ouro, marfim,
malagueta e mão de obra,
fui arrastado da minha casa,
acorrentado, vergastado,
metido à força
dentro de um navio
negreiro!
Às pressas e sem compaixão,
num dia malfadado,
soube o que era um porão,
apinhado de negros escravos,
onde faltava tudo
até o pão !
Fui humilhado por tudo e por nada,
vi morrer à minha frente
gente desesperada!
Num silêncio amordaçado
fui levado par uma terra distante,
muito pouco abundante,
onde me fizeram criado,
de um fidalgo malcriado!
Vi - me de boca e coração atado,
onde até me foi negado
esse direito de amar!
Separei roupa,
coloquei cabeleiras encaracoladas,
em cabeças tresloucadas,
encerei bigodes claros
de finórios,
calcei meias e sapatos,
e ainda outros artefactos
de cavaleiro falhado,
antes de entrar na caleche
com que passeava no Chiado!
E à noite de mansinho ,eu,
tocava batuque baixinho,
era tudo o que me restava,
da minha terra amada!
Mas a força da batida
entoava e marcava
a história da escravatura!

sexta-feira, 18 de junho de 2010

DESCOBERTA DO BRASIL

ALBERTO D'ASSUMPÇÃO
in:http://pontesluso-galaicas.blogspot.com/
Eram marinheiros alentados
de cabelos compridos
e olhos claros,
partiram de Belém,
arregimentados, por vezes à força,
para carregar na úbere Índia
mil açafates de especiarias
e todas as magias sonhadas
em madrugadas pardas
de dias amanhecendo nevoeiro!
Num dia venturoso de 1500
arrastados por ventos alísios
e ainda alguns avisos
de adamastores e outros torpores,
viram terra mais cedo que o previsto!
Homens despidos , pintados
e armados de arcos e setas,
com ruídos guturais agudos,
saudaram as lusas naus,
e ofertam papagaios e algum ouro
para selar o tesouro
de futuras trocas e baldrocas!
Esses marinheiros matreiros,
recolheram as ofertas
para as apresentar no regresso
com o preciso espavento
a El-Rei D. Manuel I
E dali seguiram o seu destino
depois de baptizar a terra ardente
de seu nome Vera Cruz,
passando à frente,
rodeando o oceano,
meteram o barco nas rotas
que os haviam de levar a Calecute!
Comandava a frota Pedro Álvares Cabral
que dali partiu com alento
para trazer do Oriente
naus carregadas com pimenta
e canela,
pérolas brancas e frias,
sedas coloridas e porcelanas finas,
perfumes com asas de vento,
chás e outras infusões
que nas solidões das venturosas viagens
aquecerem mil e um corações!

quarta-feira, 16 de junho de 2010

PAISAGEM


Mari Carmen Calviño
in: http://oleoetela.blogspot.com/
No perfume da ventania
levanta–se um inconfundível aroma
a maresia banhada em Natal!
Caem as pinhas chorosas,
parindo pinhões
em rabanadas de gritos,
que naqueles terrenos arenosos,
se enterram aflitos!
Os pássaros lavam -lhes os gritos
o oceano as emoções
e o olhar do mar
em histeria,
condena aquele dia
de paisagens ganhas,
a pátios encantados,
adoçados em vinho e mel!

segunda-feira, 14 de junho de 2010

MULHER QUOTIDIANA

JOSÉ GONZÁLEZ COLLADO

Sobes a rua cansada,
numa toada apressada,
sacos em ambas as mãos,
nem ouves os palavrões,
dos guardiães do teu bairro!
Medem – te a coxa que balança,
o gingar que embala a dança,
o olhar terno
de seres ainda criança
escrita em letra de fado!
Por piedade,
tréguas nesta cidade,
chega a casa é o leite que falta,
é imperioso lavar a manta,
o fogão já desespera,
para o jantar cozinhar!
Que lindo é o travesseiro,
apara as dores da alma
e dá – lhe alguma calma,
para poder namorar!
Ergue um copo de vinho
bebido de um trago só,
esta noite o quotidiano
não a esmagará!
Colar – se - à a lua
enquanto beberica caldos,
esquentados em fogueiras
que de outra maneira
estariam apagadas!
Arde – lhe o peito
bordado de pássaros,
arena silenciosa
onde cabem todos os desejos!

domingo, 23 de maio de 2010

VAZIO

LENA GAL
in: http://ajudacomarte.blogspot.com/
Neste vazio vertical
vergo a raiva
e apago olhos sem cor!
Ás vezes é difícil dizer:
preciso de ti, hoje!
O nevoeiro ancestral
invade a alma cansada
que não vê acenos de mão
ao passar,devagar!
Não sente abraços lilás
e beijos azuis!
Quantas vezes é o chorar
que abriga o nosso respirar!
Relampejam foguetes
ao longe
num céu boreal
quente,
mas ausente de Picassos!
É um vazio
de querer o mundo
com gaivotas inventadas,
e alfabetos
desenhando aleluias
nos nossos rostos!
Um olhar solitário no horizonte
tentando salpicá - lo de perfumadas açucenas!

sexta-feira, 14 de maio de 2010

SILÊNCIO


in: http://victorsilvabarros.blogspot.com/
No silêncio nos ouvimos
meu amor,
no Oriente dos nossos afectos,
concretos, discretos,
sem factos para nos distrair!
E eis os poetas renascidos
nos nossos gestos de ternura,
rufando tambores sem medos!
Lutámos contra os filhos de cabra
magra,
arremessando pragas
bradadas
com veemência,
contra quem nos quer ferir!
Subindo desde o umbigo
vai a força e o baraço
que há – de fazer o laço
que unirá tudo que em nós
faz sentido!

quinta-feira, 13 de maio de 2010

NOITE

Carlos Dugos
in:http://eaobranasce.blogspot.com/
Naquele bar esconso,
um olhar exangue,
vestido de negro e vermelho,
está sempre pronto a vender – se
em laçadas e copos turvos de álcool!
Mãos de lama e trevas
ousam tocar um corpo redondo
numa luxuriante fogueira
saciada em qualquer portal!
Não dás por nada
em cima de altos tacões,
apertada por infindas ilusões,
velada com máscara de Carnaval!
A vida vai a correr
ao redor de outros desejos,
num palco lavado
e pensado
para seres actriz principal!
A herança deita - a fora,
respira um ar enfeitado
e faz uma roda
com as mãos
que não compram num guiché,
para um momento,
um amor de vintém,
mas a luz que conduz
a outras salas, outras horas!

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Mendigos

Ignácio Hábrika

MENDIGOS
São mendigos de olhar gasto
numa cidade fugidia
pedem para tudo e para nada
na sua vida emprestada!
Quem saciará tal fome,
quem calará tanto frio,
quem embalará o feitiço
de milhares de olhos
sem lugar de abrigo?
Percorrem as ruas barulhentas
em esgares ensaiados,
quem tem coração, quem tem,
quem me quer dar hoje
o pão?
Metem a moeda ao bolso
sem olharem ao desgosto
de uma partilha forçada!
Mendigos e loucos
que armas transportam
para as fogueiras,
a que algemas se querem acorrentar?

terça-feira, 11 de maio de 2010

SAUDADE

Carlos Dugos
in: http://eaobranasce.blogspot.com/


SAUDADE
Saúda,
há que saudar,
quem fica no cais de embarque,
olhos negros e doces
que choram
a entrada no veleiro
do seu amor,
empurrando um estranho nevoeiro!
Ai saudade tamanha,
presa em mãos suadas
que se alimentarão
de outras vertiginosas estradas!
Num subtil ramo de rosas,
vermelhas e perfumadas,
acabarão as saudades,
magoadas,
de uma vida inteira!
Prender - te à terra
num beijo,
é o meu desejo,
fogo de artificio
para festejar a última chegada!

domingo, 9 de maio de 2010

MULHER

Joaquim António, in "www.espacoloios.com
MULHER
Mulher ribeirinha
de passo cadenciado
ginga a anca larga
no seu passo apressado!
Os seios são um baloiço
cobiçado,
ondeante,
a caminho do mercado!
Galga a viela estreita,
anunciando os frutos
sumarentos e coloridos,
confundindo sentidos!
Terno é o seu olhar
quando abraça o rio
barrento,
junto a um cais barulhento,
com inventados marinheiros
e desejadas partidas!

domingo, 14 de março de 2010

A MINHA CIDADE

JAVIER NIETO VELASCO
in:http://salaodaprimaverade2011.blogspot.com/

A MINHA CIDADE
É de granito molhado
magoado pelas chuvadas
violentas
sedentas de frutos e arados!
Que estranho é este silêncio
dormente,
onde faltam correrias,
tacões que ficam
no empedrado da calçada!
Crianças que aos bandos
deixavam gritos
escritos
nas casas de ferro forjado
adornadas!
Pregões tarimbados em vozes
roucas
que de manhã teciam vida
a caminho dos velhos mercados!
Notícias que passavam
repetidamente no fundo da Avenida,
enquanto se tomava um café
ali ao pé ,no mítico Guarani!
Nota – se uma certa tristeza
nesta cidade negra
esperando melhor sorte,
outro Norte!

VIDA

PACO RAMOS
in:http://artistasgalegosnoporto.blogspot.com/

Espalha – se pela cidade
em muros brancos e vazios
onde loucos escrevem as suas histórias!
São Grafitis, Banda Desenhada,
Poemas, Mensagens,
em tarjetas:
Amo – te Ana!
Pela calada da noite,
o tempo gasta – se em beijos molhados
dados ou vendidos
em bocas loucas
que param em cada esquina
para reinventar - se!
De bares esconsos
saltam seios de decotes
indecentes,
gasta – se em cada copo
alguns medos
e contam – se segredos
outrora fechados!
Já cansados
penduram no trinco das portas
os sonhos
e os ponteiros do relógio,
e tudo volta a ser igual
no dissipar do nevoeiro matinal!

DONA RITA

CARMEN SEVILLANO ESTREMERA
in:http://artistasgalegosnoporto.blogspot.com/

Dona Rita
brinca , sentada no infinito da bruma
onde um cabelo loiro ondulante,
balança na dança do tempo,
e pensa sobre um planalto,
desenhando olhares errantes,
num livro de histórias sentidas!
Princesa galesa
que ficou presa
sem querer
neste druida lugar!
Estranho são olhos azuis
a mordiscar selvagens cerejas
em dias de menires
homenageando deuses
extintos!
Naquela montanha estranha
erguem – se vulcões
nos lumbagos de cavalos
fazendo filas ao longe
para iluminar a cidade!

domingo, 24 de janeiro de 2010

IR POR AÍ



FERNANDO SIMÕES
in:http://salaodaprimaverade2011.blogspot.com/

Por aí eu quero ir
em naves com asas
fazendo voos rasos
nas paisagens espelhadas
nos olhos da vida!
Por aí eu quero ir
antes de cada Verão,

dia sim , dia não,
comer o pão de centeio
embebido em azeite
e mãos fermentadas
pelas horas,
servidas em taças de poesia!
Por aí é que eu quero ir
com canções que florescem
nos cantos nus das cidades,
toadas nos vãos das escadas
fabricando fogueiras
onde antes havia gritos aflitos!
Por aí é que eu vou
criando outros compromissos
em mesas de Domingo Pascal!

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

A MALA MEL


J. Valcárcel


As palavras estão gastas
num mundo sem partilha,
cavalos desenfreados
passam por cima dos sonhos
e deles fazem fardos de palha!
Eu que podia pedir pouco
achava que tinha direito
a uma mala cor de mel!
Num Domingo de poetas,
pé ante pé
e sem grande treta
fiz solenemente o pedido.
Pus toda a gente em sentido,
juntei cravos e rosas
no mesmo canteiro
e o acto foi certeiro
concederam a esta poeta
uma mala mel!
Num mágico segundo
coube ali o mundo!

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

SABORES DE INFÂNCIA


JOSÉ GONZÁLES COLLADO
in:http://josegonzalescollado.blogspot.com/


Tinha a minha mãe

mão certa,

para na cozinha engendrar

pratos que afagavam

o nosso paladar!

O Domingo era festivo

com canja fumegante,

onde cabiam as miudezas do galarote,

perfumada com fresca hortelã!

O nispo adocicado

com polpa de tomate e colorau,

era apresentado fatiado

com batatinhas e nabiças,

cultivadas no nosso quintal!

Para surpresa

em cima da grande mesa,

de quando em vez

na travessa alinhada,

estava um frango de carne escura,

abafado com vinho do Porto

e ervilhas!

Era grande a confusão

naquela sala sem luxos,

a gula esperava

em ânsias de se saciar!

Os garfos em riste

esperavam para actuar

era unânime a opinião :

que bom !que bom!

domingo, 3 de janeiro de 2010

ROSABELA

JOSÉ GONZÁLEZ COLLADO
in:http://salaodaprimaverade2011.blogspot.com/


O que pensas Rosabela

quando te pões à janela

com o teu olhar

distante?

Riscar do teu calendário

dias entediantes

numa ausência de pasmar?

Sem planos de avançar

na procura de um amigo

para poderes abraçar

por dentro e por fora

a vida naquela hora!

Deitar– te na cama

larga,

sem o vil pressentimento

que a solidão

será o teu par!

Ah, Rosabela,

bela, bela

solta os cabelos ao vento,

pinta os lábios de encarnado,

dá alento à tua vida,

caminha nua, na rua,

procurando firme

o teu momento!




sábado, 2 de janeiro de 2010

EL REI D. JOÃO I


MARIA LEAL DA COSTA
in:http://pontesluso-galaicas.blogspot.com/


Era um escondido bastardo

filho de EL)Rei D . Pedro I

e de sua amante Teresa Lourenço,

surgiu do nada

e na ponta da sua espada

reescreveu este país,

sempre adiado!

Dizem que foi a táctica do quadrado,

a ajuda inglesa e ainda alguma treta

diplomática,

que pôs em sentido os Castelhanos!

Mas foi o fervor e valentia

do seu exército de namorados,

que os derrotou em Aljubarrota!

Ergueu com ele na vitória, a Virgem,

a quem erigiu o templo de Santa Maria,

os burgueses passaram a ser seus pares,

nas decisões desta nova nação,

de desvairadas gentes.

Ao leme de mastros altivos,

feitos do pinhal de Leiria,

mandou seus filhos pelos mares,

para fazerem no novo mundo

um vasto Império!

Com marinheiros improvisados,

encheram – se as primeiras barcas

que partiram apressadas

para Ceuta!

A vontade de fazer a epopeia

era tanta, que,

foram – se deixando empurrar pelos ventos ,

chegando aos Açores e Madeira!

Disseram as cartas de bordo

que em noites de luar

os marinheiros carentes,

namoravam as sereias,

no convés silencioso!

Puxavam - nas para as barcaças

e com baladas dolentes,

saídas de portuguesas guitarras,

faziam sair dos seus lábios,

canções de amor suado!

Fique pois na História

este Rei visionário,

que partindo deste lado do Oceano,

empurrou o país para diante!

GOSTAR DE TI


VICTOR SILVA BARROS
in:http://victorsilvabarros.blogspot.com/


Quando à noite

ao bater das oito redondas horas,

ponho na mesa pratos coloridos

que fazem algum sentido

com a toalha azul escuro,

gosto de ti!

Quando encosto o rosto

à jarra enfeitada com rosas vermelhas

sentindo a ternura

brotar no momento,

gosto de ti!

Quando abro a garrafa do teu vinho tinto

preferido,

num copo redondo,

que espera sedento,

a prova de amor,

gosto de ti!

Quando te sentas

e os cheiros a aromáticas ervas

salta dos tachos

para o teu prato,

num ritual desejado,

gosto de ti!