terça-feira, 15 de outubro de 2019

A SALA DA AVÓ OLINDA

Nunes Amaral
A SALA DA AVÓ OLINDA

A sala de jantar
era cheia de gavetas:
a mesa gigante,
(a família era enorme)
tinha 4 gavetas
nas laterais,
encontravam-se sempre
algumas fotografias
de três gerações,
em poses estudadas,
os cabelos delambidos,
os sapatos lustrosos.
A cómoda de castanho,
repleta de gavetas
onde se guardavam as roupas,
as gravatas, as meias
de seda das tias,
os xailes de merino,
os lenços bordados a ponto cheio.
Por cima o oratório
com o medonho senhor dos Passos
de roxo e rosto sofrido.
Nas paredes pequenas prateleiras
com pequenas gavetas,
onde se colocavam as medalhas
ganhas em competições da Tuna.
A arca de Noé, cheia como um ovo,
era um repositório
de roupas de cama,
vinho do Porto ofertado
e guardado a sete chaves,
documentos, facturas
cartas e muitos postais.
Nós, os da nova geração,
perspicazes e à frente
deste pensamento corriqueiro
e provinciano,
saído da Morgadinha dos Canaviais,
porém gostávamos
da mesa cheia de gente,
das travessas cheias de comida,
das palavras gritadas,
das gargalhadas, do calor.

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