Fernando Veloso
DIA DE FINADOS
Hoje estou a pensar
numa fila de gente
que me ofereceu amêndoas,
fatias de pão-de-ló,
me pegou na mão
levando-me para a escola,
me penteou o cabelo,
embalou no colo.
Já sonhavam comigo
antes mesmo de eu nascer:
os meus avós, tios,
todos, quase todos
partiram.
Na casa de família
que ainda existe,
mora um primo meu,
deita-se no quarto
onde nasci eu
num parto longo e de dor.
O jardim lateral
em que a minha avó
cuidava dos jarros
esmagados
que saravam as queimaduras.
Tanta festa, ajuntamentos,
baptizados, casamentos,
ralhos, faltas de dinheiro,
mentiras, verdades cruzadas,
o padre Vigário abençoando
até a algazarra da criançada.
Tudo pertence ao passado,
restou para mim a saudade,
e, uma garrafa de cristal
onde a minha avó Olinda
guardava o vinho do Porto.
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